Por que a sede do Parque Pedra do Sol fica na Serra do Cipó?

Além do valor arqueológico e arqueoastronômico, o Parque Arqueológico da Pedra do Sol desempenha um papel crucial na educação ambiental com a missão de conscientizar a comunidade sobre a importância da preservação desse ecossistema tão singular.

O cerrado de campo rupestre é reconhecido não só pela rica herança cultural, mas também pela função vital na retenção e na distribuição da água doce potável no país — sendo indispensável para a sustentabilidade hídrica de diversas regiões.

Biodiversidade do cerrado mineiro

O cerrado desempenha um papel crucial como um dos biomas responsáveis pela retenção e armazenamento de água no país, sendo amplamente reconhecido como a “caixa d’água” do Brasil: essencial para o abastecimento de muitas regiões.

As plantas adaptadas às condições de grandes altitudes nos campos rupestres — muitas exclusivas deste bioma — desempenham um papel fundamental na captação e condução de água para os lençóis freáticos.

A flora afeta diretamente a recarga subterrânea, garantindo a continuidade do fluxo de água e abastecendo regiões inteiras.

Devido à falta de incentivo governamental, ao desmatamento causado por setores econômicos inconsequentes, e à vastidão do território, o cerrado ainda guarda muitos mistérios no campo das ciências biológicas.

Esse cenário torna a região um ambiente fértil para pesquisadores que buscam desenvolver carreiras por meio de investigações científicas, ao mesmo tempo em que a preservação desse ecossistema se torna cada vez mais urgente.

Os campos rupestres de altitude

O Parque Pedra do Sol tem um papel crucial na preservação das espécies nativas do Cerrado — um bioma que se destaca pela rica diversidade e incrível resiliência.

Com 15 hectares preservados, o Parque Pedra do Sol se torna um refúgio vital para diversas espécies ameaçadas pela mudança climática e os incêndios criminosos.

As plantas que existem no parque compõe um bioma único de campo rupestre, com flora e fauna endêmicas que só existem acima de 900 metros de altitude — característica que fez com que Roberto Burle Marx apelidasse esta área como o “Jardim do Brasil”.

Entre as plantas que encontram abrigo no parque, têm destaque:

  • Sempre-viva (Actinocephalus), planta ornamental com inflorescência típica dos cerrados de campo rupestre na Serra do Espinhaço;
  • Arnica-mineira (Lychnophora pinaster), planta medicinal de aspecto arbustivo, conhecida pelas folhas alongadas e com florações roxas características;
  • Canela-de-ema (Vellozia spp.), planta marcada pelo caule retorcido, além de flores roxas ou azuladas que surgem em meio às folhas e pontiagudas;
  • Além uma infinidade de espécies registradas de flores, ervas, arbustos e árvores, que formam um complexo mosaico da evolução da vida nessa região.

Fauna do cerrado mineiro

A fauna do cerrado de Minas Gerais é uma das mais ricas do Brasil graças à enorme variedade de habitats presentes na região.

Cheio de savanas, campos e florestas, o Cerrado cria as condições ideais para o desenvolvimento de inúmeras espécies de animais adaptadas às condições extremas de longas estações secas e altas temperaturas.

É por isso que uma das principais atividades do Parque Pedra do Sol é a observação de aves.

Entre as espécies mais representativas da fauna mineira, podemos destacar:

  • Carcará (Caracara plancus), ave de rapina conhecida pela habilidade de consumir tanto presas vivas quanto carniças;
  • Veado-campeiro (Ozotocerus bezoarticus), mamífero brasileiro em risco de extinção, encontrado em campos abertos;
  • Tucano-toco (Ramphastos toco), famoso pelo grande bico colorido, sendo uma das aves mais emblemáticas do Cerrado;
  • Águia-serrana (Geranoaetus melanoleucus), ave de rapina dominante nas montanhas do Chile que também caça e faz ninho no Cerrado;
  • Onça-parda (Puma concolor), felino nativo das Américas e em risco devido à perda de habitat;
  • Lobo-guará (Chrysocyon brachyurus), espécie solitária e de longa pelagem, está ameaçada pela perda de habitat e a caça ilegal;
  • Sapo-pedra (Rhinella schneideri), conhecido pela camuflagem impressionante, imitando a textura das pedras para se esconder dos predadores;
  • Tamanduá-bandeira (Myrmecophaga tridactyla), com uma dieta especializada em formigas e cupins, equilibrando a população desses insetos.

Esse bioma se apresenta não apenas como um centro de biodiversidade, mas também como um campo fértil para projetos científicos, com novas espécies e interações ecológicas esperando por pesquisadores apaixonados para serem mapeadas.

Arqueologia na Serra do Cipó

O município de Santana do Riacho possui mais de 50 sítios arqueológicos, muitos deles no Parque Nacional da Serra do Cipó e nas áreas de altitude da Área de Preservação Ambiental (APA) Morro da Pedreira, onde encontra-se o Parque Pedra do Sol.

Durante os levantamentos de campo, nossa equipe localizou ao menos 20 sítios em áreas de altitude no Vau da Lagoa.

A Serra do Cipó guarda as datações de ocupação humana mais antigas das Américas, com cerca de 12 mil anos de história.

O sítio arqueológico mais estudado do município é o Grande Abrigo de Santana do Riacho, que foi escavado pela missão franco-brasileira entre 1976 e 1979. Este sítio está localizado a apenas 12 quilômetros em linha reta do Parque Pedra do Sol.

O Grande Abrigo é um abrigo rochoso com mais de 100 metros de extensão e por volta de 2.500 pinturas rupestres distribuídas em 13 painéis.

Durante as pesquisas foram encontrados 40 indivíduos sepultados, com datações de até 9 mil anos. Outro achado significativo foram vestígios de grãos de milho de aproximadamente 2.800 anos.

Esses dados sugerem o possível cultivo em uma cronologia anterior ao período geralmente aceito para a domesticação desse vegetal no Brasil Central.

As pesquisas no Grande Abrigo localizaram inúmeros artefatos, como:

  • Algumas cerâmicas;
  • Instrumentos de ossos;
  • Contas de colares de sementes;
  • Vestígios da alimentação vegetal e animal;
  • Fragmentos de artefatos de pedra lascada e polida;
  • Além dos fragmentos têxteis mais antigos registrados no Brasil, localizados em contexto ritual e datados entre 8 mil e 10 mil anos atrás.

A Serra do Cipó é um verdadeiro museu a céu aberto, repleto de abrigos rochosos decorados com pinturas rupestres em tons de vermelho, amarelo e preto, retratando formas de animais chamadas pelos arqueólogos de estilo Planalto.

A Lapa da Sucupira se destaca entre elas, já que apresenta grafismos diferentes em relação aos comumente encontrados na região.

Os desenhos incluem os “bonecões” do estilo Agreste, levantando a hipótese de contato entre grupos de matrizes culturais diferentes, ou até a ocupação da região por populações distintas ao longo dos milênios.

A ocupação humana na Serra do Cipó foi possível sobretudo pela abundância de água, exemplificada pela beleza cênica das mais de 200 cachoeiras na região, com cursos d’água perenes e navegáveis — como os do Rio Cipó e Parauninha.

Os primeiros grupos caçadores-coletores da região mapearam o cerrado mineiro e entendiam a dinâmica da natureza:

  • Era comum a coleta de coquinhos de licuri, patauá e sementes de jatobá;
  • E a caça abundante incluía tatus e veados, conforme os vestígios localizados no Grande Abrigo de Santana do Riacho.

As pedreiras do Espinhaço forneciam cristais de quartzo hialino, amplamente utilizados no lascamento e na confecção de instrumentos, como pontas de projéteis.

Também era comum a obtenção de materiais de regiões mais distantes, como o sílex — uma matéria prima de ótima qualidade que provavelmente era adquirida por meio de trocas com outros grupos.

A importância de preservar e estudar esses locais vai além da simples conservação de artefatos e pinturas.

Cada sítio arqueológico no município representa uma oportunidade única de explorar as raízes da ocupação humana no Cerrado e entender as relações entre o ser humano e o ambiente ao longo dos milênios.

Detalhes do Parque Arqueológico da Pedra do Sol

  • Localização: Vau da Lagoa, Santana do Riacho – Minas Gerais, Brasil;
  • Coordenadas: 19° 14′ 12.90” S – 43° 36′ 01.04” O;
  • Unidade de Conservação: APA Morro da Pedreira;
  • Classificação de Proteção: Zona Rural do Cerrado;
  • Clima Predominante: Tropical de Altitude;
  • Geologia: Supergrupo Espinhaço;
  • Área Atual: 15 hectares;
  • Bioma: Campo Rupestre;
  • Altitude: 1.170 metros;
  • Hidrografia: Córrego da Samambaia, bacia do rio Parauninha;
  • Bem Cultural: Sítios arqueológicos pré-coloniais com pinturas rupestres;
  • Bem Natural: Mata ciliar do córrego Mãe d’Água em ambiente de campo rupestre.

Saiba mais sobre o Parque Pedra do Sol